O que é Portugal?
“Perdi meus fantásticos castelos, Como névoa distante que se esfuma… Quis vencer, quis lutar, quis defendê-los: Quebrei as minhas lanças uma a uma!
Perdi minhas galeras entre os gelos, Que se afundaram sobre um mar de bruma… – Tantos escolhos! Quem podia vê-los? Deitei-me ao mar e não salvei nenhuma!
Perdi a minha taça, o meu anel, A minha cota de aço, o meu corcel, Perdi meu elmo de ouro e pedrarias… Sobem-me aos lábios súplicas estranhas… Sobre o meu coração pesam montanhas… Olho assombrada as minhas mãos vazias…”
No Alentejo, Florbela Espanca. Rasgando planícies, de olhar no horizonte, surgem perguntas, dilemas, incómodos. Quem és tu Portugal? Onde estás, depois dos homens que partiram? Para onde levaste essa alma enorme, dos que habitaram tais castelos, vestiram armaduras e choraram secretamente dentro delas? Onde paira a tua identidade, entre o amor e a sátira ao santuário, entre o fado e a Sereia Louca, a herança africana, o sonho europeu, o irmão espanhol, o irmão brasileiro e aquele novo amigo chinês? Onde puseste a verve, a sede de infinito, a saudade e a liberdade?
Ora essa, tanta pergunta. Portugal é tudo! Portugal é dizer mal de si próprio e a seguir dar o corpo às balas em defesa de qualquer português. Portugal é ser melancólico e soltar uma gargalhada com a lágrima ainda na face. Portugal é ser contra o alcoolismo e adorar vinho. Portugal é ser fumador e anti-tabaco. Portugal é ficar obeso no sofá e no ano seguinte fazer a maratona. Portugal é ser monárquico, conservador e… gay. Portugal é ser verde e encarnado (e azul, pronto). Portugal é não ter instrução e ser um génio. Portugal é acreditar na Maya e inventar uma coisa qualquer. Portugal é o país do diminutivo e do desejo (e facturinha, vai desejar?). Portugal é o país da piada fácil (queria, ou quer?) e do António Lobo Antunes. Portugal é alto e baixo, é branco e preto e inventou a mulata. Portugal é um país de aparências, extremamente autêntico. Portugal é paixão e uma enorme sede de Liberdade. Portugal sou eu. Portugal és tu. Contraditórios? Não, complexos.
Portugal são 23 gajos no TransPortugal em 2015, emanando competição, tenacidade, força, persistência. Enfim, coisas da testosterona. E charme. Muito!
O delfim deste grupo português é o Pedro Castro (523, 58º na etapa de hoje), 27 anos, o mais recente elemento da equipa Europcar. Reza a lenda que este infante terá menosprezado os seus companheiros, no primeiro treino conjunto. Serenos, os experientes cavaleiros deixaram-no granjear uma vitória breve, em piso inclinado, para, seguidamente, o verem sucumbir descarregado, e saborearem então um clássico quem ri por último ri melhor. Um arremedo de justiça karmica quebrou ainda a sua dama. Pedro monta agora uma outra para a qual, alegadamente, não tem ainda pedalada.
Fontes seguras revelaram outras idiossincrasias da equipa Europcar. Organizada hierarquicamente, com ramificações internacionais, a equipa é liderada pelo Master, nome de código Paulo Moura (385, 70º na etapa de hoje), coadjuvado pelos dois conselheiros Lourenço Lobo (aka Lobão, 436, 60º na etapa de hoje) e Filipe Clérigo (aka Filipinho, 559, 40º na etapa de hoje). Lobão e Filipinho praticam a chamada desarrumação criativa in loco, precedida de metodologia logística. Um deles faz-se acompanhar de kits alimentares, acondicionados em sacos individuais, um para cada dia da prova. Não obstante, em virtude da sua curiosidade galopante, gosta de inovações, por vezes com consequências danosas para o seu aparelho digestivo, mas essenciais para o adubar das terras. Ocasionalmente, algum turista incauto poderá deparar com uma figura alva, sem vestes, entre o verde da montanha… Adiante. A equipa conta ainda com o Jorge Damas (245, 61º na etapa de hoje), responsável organizacional e Sérgio Campos (524), departamento comercial. Todos são iniciados no Método Malvar, que praticam diariamente, no banho. O resto são rituais secretos.
Oh Inês, Inês… Alexandre Guilhoto (564, 5º na etapa de hoje) suspira por Inês ao som de Greenday e Simple Plan, na Barragem do Caldeirão ou ante as paisagens supremas do Vale do Mondego. Se a coisa corre mal, vê novelas. Se corre bem, vê o Senhor dos Anéis. Não ficou claro se Alexandre usará o anel em breve, mas lá que gosta de moda, não há dúvida. Este rapaz tem uma noção muito própria dos básicos: adora camisolas amarelas.
O amarelo é decididamente uma tendência de runaway aqui no TransPortugal (não percebi ainda porquê?!). Outro fã é Marco Macedo (362, 4º na etapa de hoje). Também este rapaz anda atrás da mesma camisola (pergunta: eles usam todos a mesma em sistema de roullement? É um bocado porco, não?)
Marco Macedo é engenheiro civil de formação. Mas quando se anda de bicicleta a vida dá muitas voltas e Marco trocou o cimento pelo vento na cara. Marco é actualmente director de desporto no Hotel Serra da Estrela. Não obstante, a maior paixão de Marco é grandiosamente frágil: os seus 3 filhos, Inês, Beatriz e Francisco. Oh Marco, como é que eu ensino as minhas filhas a andar de bicicleta?! Marco recomenda as bicicletas sem pedais. Entre guiar, travar, pedalar e equilíbrio, começar por eliminar o pedalar. Parece que funciona.
Não discutimos a colecção de Verão, mas desconfio que também o Tiago Almeida (497, 7º lugar na etapa de hoje) é rapaz para ambicionar a mesma camisola (isto começa a soar estranho). O nutricionista da Maia é simpático e bem apessoado. É o momento de felicidade que se avizinha: vai ser pai e é uma menina. Tiago toca bateria. Tiago, vais parar com isso quando nascer a bebé, está bem? Em matéria de nutrição, Tiago acompanha Marco Macedo, Francelino Fernandes (518, atleta que se lesionou), Domingos Ladislau (519, 10º na etapa de hoje), Nuno Vitorino (537, 16º na etapa de hoje) e João Oliveira (534, 44º na etapa de hoje). Domingos é sargento de educação física, sendo Campeão Nacional Militar de Duatlo. Domingos, concordo: nada de brincadeiras na água que uma pessoa pode tornar-se comida de peixe antes do tempo. Domingos é polifacetado: toca guitarra, cavaquinho, acordeão e bateria, mete-se em gospel, folclore e namora Isabel, atleta que gosta de cerejas. Nuno Vitorino vive com a Inês e dois gatos. Nuno é fisioterapeuta e adora viajar. Inês, Isabel, Isabel, Inês…
Conclusão: há grande consenso em torno de camisolas amarelas e letra “I” na escolha de namoradas.
Andam por aqui uns tipos chamados Salta Pocinhas Racing Team. Há nomes melhores, diria eu. Mas estes rapazes, MAMILs assumidos (e em excelente estado, diga-se) são dotados de … um sentido de humor apurado e de alguma qualidade mental, pensaram o quê?!!. O Luís Mafra (548, 52º na etapa de hoje) e o Ricardo Dinis (560º, também 52º hoje) são engenheiros electrotécnicos e capazes de dissertar um bocado sobre parvoíces. Por exemplo, sabem que a vida é feita de muitas cores, sendo o amarelo apenas uma. Os dois outros membros do grupo são o Ricardo Gonçalves (549, 5º na etapa de hoje) e o Pedro Vieira (550, 7º na etapa de hoje). Estes mais apegados ao amarelo, vê-se logo. O Pedro Vieira confessa: sou muito competitivo. Eu afirmo: é um verdadeiro fanático do desporto. Sabem porquê? Porque aos 17 anos foi medicamente declarado incapacitado para toda a actividade desportiva. A partir daí, foi um vê se avias. Há gajos teimosos como raio. Agora imaginem aturar isto em casa. Irra! Deve ser carneiro.
O Miguel Rola Costa (472) e o Alexandre Branco (494, 42º na etapa de hoje) são protegidos da Marta (por interposta pessoa e a título de propriedade), que veio até ao Alentejo averiguar de alguma ocorrência, não vá uma certa tarada fazer olho gordo ao pacote alheio. Sempre gostei de mulheres com atitude, o grande segredo da alma lusa.
Na categoria de produto nacional, temos ainda o António Filipe (505, 37º na etapa de hoje), o Sérgio Perinhas (532, 14º na etapa de hoje) aka o homem do bacalhau, residente na Noruega, frio do caraças, não sei como ele aguenta (suspiro), o Ricardo Cruto (545, 56º na etapa de hoje) e o António Avelino Pereira (515, 40º na etapa de hoje). O Ricardo e o António, cada um à sua maneira, sabem o que é a dureza da via. O Ricardo tem 28 anos e é enfermeiro numa unidade de hemodiálise. Trabalha por turnos e treina quando pode. Não é para qualquer um. O António é professor de educação física do 2º ciclo. É um nobre: tem 4 filhos e sensatez. O António transmite paz. Ou então era o ambiente da sala de massagens.
Portugal é isto: 23 homens no Transportugal, mulheres zero. Portugal é o prazer e a alegria de conhecer estes homens, o seu enorme espírito de sacrifício e as suas histórias. Portugal é a tristeza da ausência delas nesta prova.
Portugal é detestar e adorar a Espanha. É dizer nem bom vento, nem bom casamento mas falar de nuestros hermanos…e beber Mahou no final do TransPortugal.
E assim conhecemos Ignacio Miravalles (291, 7º na etapa de hoje), aka Iñaki, Howard Jones (506, 46º a chegar a Évora) e David Perez Jaramillo (513, 29º na etapa de hoje). Iñaki namora com Isabel (outra vez?!!!), com a qual já fez o Transpyr, em equipa mista. Iñaki brilha quando fala do que gosta. Apesar dos seus 37 anos, é um homem destemido e de carácter forte. Detesta excessos e exibicionistas. Adora o TransPortugal e não compreende por que razão não há mais espanhóis a fazê-lo. A montanha é a sua fuga ao trânsito de Madrid. Pergunto por música e… Fado. Iñaki adora fado, electrónica e música celta. Planos para o futuro? Altavia e Sudety MTB Challenge, com a Isabel. David trabalha para a Thyssen-Krupp nos intervalos das suas múltiplas vindas a Portugal. David vai voltar em Junho para o World Master MTBO Championship. Hey miúdas, é um MAMIL guapíssimo e não tem namorada!
Na etapa de hoje do TransPortugal, entre Castelo de Vide e Évora, os atletas organizaram-se em grupos. Em primeiro lugar ficou a Kate Aardal (341, NO), seguida do Malcolm Dods (310, SA) e do Pat Dodge (446, CA). O grupo seguinte, liderado pelo Marco Macedo (362, PT) ficou a 7 minutos. Em termos globais, a Kate Aardal recuperou a camisola amarela. A três etapas do final, está ainda aberto qual será o vencedor.
A 6ª etapa, de Évora a Albernoa, tem 103km, com 893 de ganho de elevação. Trata-se etapa mais rápida da prova, com menos ganho de elevação, na típica paisagem alentejana, sendo de salientar a zona da barragem do Alvito e a passagem por Cuba.
Em 15 de Maio de 1869, foi formada em Nova Iorque a Associação Nacional de Mulheres Sufragistas. Neste 15 de Maio, os atletas portugueses e espanhóis vão fazer a 6ª etapa do TransPortugal sem companheiras portuguesas ou espanholas. Pensa nisso. Muda-o.
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TransPortugalRace 2015 by Garmin – Day 5
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